O FAROL DAS LETRAS |
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O Pipapai
O menino mede o céu com os olhos, presta atenção do alto do morro na grande possibilidade de vitória naquela manhã de Sábado. Sensibilidade tem, falta-lhe a experiência. Corre para dentro de casa, quase atropela o Sebastião: o gato que estava no tapete de retalhos da cozinha. No quarto-sala, puxa um papagaio feito à mão e a lata com dois carretéis de linha. A rabiola um metro e meio, estirante pronto, vento adequado. No trajeto para o quintal, resolve envergar um pouco mais a pipa; a aerodinâmica tem que ser perfeita, senão o trabalho perde a qualidade. Solta a pipa rumo ao horizonte, lá embaixo o mar verde esperança com suas ondas humanas batendo na areia branca encoberta com asfalto. Lá em cima, o céu azul celeste esperando o Capitão Nemo, antes que se torne pumbleo. O menino, quase um ninguém, sonha, com seu grande navio, naufragar as embarcações alheias. Solta a vela, digo, a linha e avança vorazmente para uma pipa pirata e irritantemente bela. Era negra com uma rabiola de uns cinco metros e uns quatro carretéis de linha. Seu ombro enverga quarenta e cinco graus. O duelo é tão difícil que parece Santiago na luta para capturar o maior peixe já pescado. Ele percebe que a estratégia está errada, pois a pipa deve ir para leste e não oeste. A mãe dá um berro da cozinha, mas ele nem se assusta, quer é mesmo pescar. Corre os dedos infantis sobre a linha branca, num toque, avança e arma o bote. Pronto! Não, quase. Recomeça. O pipapirata traça no céu uma curva e atinge o peito do Nemo. Ele escapa, mas o cansaço é visível. Não, cuidado aí não! Boom... Lá vem outro torpedo. Boom! O vento aumenta, é chuva, tempestade. O capitão assume o controle, grita, gesticula, analisa. Ouvesse um estrondo: tátátátá. Corta, corta, corta, orta, ta... Apara, apara, apara, para, ara... Pipabarco onde embarco ou desembarco. Não posso desistir, agora, agora... Pronto! Quase, falta pouco. O pipapirata desliza pelo céu como serpente marinha, seu veneno é cortante. Menino, corra agora. Só que ele é forte. A mãe grita novamente, agora com mais veemência. Ele olha e diz já vou. Aí vai ele de novo com seu capitão Nemo estampado no papel de seda. Corta o estirante do pipapirata, prende-o pela rabiola, solta a linha para ter certeza e... O pipapirata e o Alma Negra afundam pelo horizonte do morro. Só se escutam os gritos de alegria do menino Nemo. O Pipapai feito com o pai dá a maior lição quando se é criança: nunca se esqueça dos seus sonhos. É mais uma tarde em São Paulo. Ainda se vê o contorno do Nemo e seu navio PIPAPAI no céu. ![]() |
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